segunda-feira, 24 de maio de 2021

Tia Marilda e o meu primo Juninho

Marilda é minha tia por parte de mãe. Ela não possui uma renda formal, mas consegue uns trocados - não mais que 500,00 - fazendo faxina e esporadicamente cuidando de um idoso que mora na rua dela.  

Seu marido é um soldado reformado da Marinha que com seus 74 anos luta contra um câncer de próstata em estado avançado. Seu soldo, se não me falha a memória, é de 1.500,00. No entanto, 30% desse valor é consumido pelos mais de 9 empréstimos consignados que ele possui. Ao término do mês, descontadas algumas contribuições, ele recebe 950,00.
Desde que eu era criança eles vivem uma vida apertada, mas devido ao câncer, ele foi "automaticamente" promovido a cabo e passou a ganhar aproximadamente 2.600,00. Para completar a "benção", ele recebeu uma indenização em torno de 28.000,00.

Com um dinheiro nunca antes visto, a sua primeira ação foi pegar os 28 mil e dar de entrada em um carro para o filho (falarei sobre ele mais à frente). A segunda ação foi pegar a maior quantidade possível de empréstimos consignados até alcançar o limite legal de 30% de comprometimento do soldo. Com a "dádiva" ele se animou e passou a ter 17 empréstimos. Uma parte da grana desses empréstimos ficou com ele - que já torrou - e o que restou foi dividido entre 3 filhos de outro casamento (herança por meio de empréstimo, wtf???).

Passado um ano, veio outra surpresa, dessa vez desagradável. Uma decisão do TCU determinou à Marinha que cancelasse a promoção dele a cabo. Com isso, seu salário voltou aos 950,00 líquidos. Hoje, encontra-se sem patrimônio e com uma infinidade de empréstimos.

Do lado avesso, está o meu primo Juninho (nome fictício). Ele tem 24 anos, mora com a minha tia, faz faculdade de administração em uma universidade pública e não trabalha. Possui um carro cuja prestação - paga pelo pai - é de pouco mais que 400 reais.

Ele tem iPhone, Playstation 4, um mouse de 400 reais e o combo do entretenimento brasileiro: Netflix, Amazon Prime, GloboPlay, Disney Plus e Spotify. Anda com roupa e tênis de marca. Quem o vê nas mídias sociais não imagina o perrengue que a minha tia passa para que ele tenha uma vida de rei. Acreditem, ela paga a uma amiga para dirigir o carro dele até a garagem pois o belo nem pra isso serve. Pior que isso: é a minha tia que lava o carro dele todo santo sábado!

Há uns 5 anos, o marido de uma outra tia falou pra minha tia Marilda que havia conseguido uma vaga de emprego para o meu primo por meio de um programa chamado Jovem Aprendiz. Minha tia rodou a baiana! Disse que jamais o filho dela trabalharia por um salário mínimo. Em outra oportunidade, ela disse que uma oferta dessa era uma ofensa e que "não estava passando fome".

Na semana passada, eu soube pela minha mãe que a tia Marilda tinha pedido ao meu pai 50 reais para colocar gasolina no carro do filho. Eu também soube que há alguns meses uma outra tia recebeu uma ligação da tia Marilda às 23h pedindo para ela pedir uma pizza para o meu primo Juninho - ela disse que depois pagaria. Por fim, nesta semana a minha mãe me contou que vai fazer um ano que a tia Marilda passa lá pra buscar 1kg de carne de sol - sim, o belo só come carne de sol. Pasmem, meus amigos, ela corta e desfia (!) a carne pra ele! Os pais, coitados, se saciam com frango e ovo.

A última vez que o marido da minha tia quis dar uma surra no filho, ela puxou uma faca pra defendê-lo.

Durante o ensino médio, custeei 70% do valor dos seus livros didáticos. Na época eu não ganhava bem e isso pesava no meu orçamento, mas os ajudei. Não que eu faça questão, mas até hoje ele não me disse ao menos um obrigado. Talvez seja o reflexo da sua criação.

Esta postagem é um desenrolar do texto publicado no blog Viagem Lenta chamado "Até que idade os pais devem sustentar os filhos". Imediatamente me veio à mente essa triste realidade vivida pela minha tia Marilda, pelo marido dela e pelo folgado do meu primo que não trabalha e não tem o mínimo de empatia e compaixão para com seus pais.

Qual o limite para os jovens que vivem com os pais?

6 comentários:

  1. Complicado mesmo, eu moro com os meus pais, mas ajudo com 1.500,00 todos os meses nas despesas da casa, tenho um emprego formal e outros 2 informais que me rendem mais uma grana extra de acordo com o que eu trabalho todo mês. Tenho uma irmã de 34 anos que está desempregada há 3 anos, não ajuda em nada nas despesas da casa e ganha 600,00 de mesada do meu pai, e não quer nem saber de procurar emprego, meus pais é que eventualmente metem a cara e pedem para algum conhecido fazer o favor de contratar ela, mas sempre acaba na mesma, ela trabalha alguns meses e dá um jeito de ser mandada embora, está ficando velha, obesa, mau humorada, fica até de madrugada vendo netflix e acorda 11:00 da manhã para tomar café e logo depois almoça e vai tirar a soneca da tarde, eu já deixei bem claro que quando meus pais não estiverem mais aqui eu vou morar sozinho e ela que vai ter que se virar.

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    1. Ah, velho... 34 ano, não trabalha e ganha mesada, peraí né hehehehe

      Pessoas como ela e o meu primo não pensam no dia de amanhã. Minha tia também é cúmplice porque alimenta esses maus hábitos do filho dela. É uma pena que a gente tenha que conviver diante de fatos como esses que nos causam indignação, mas que pouco podemos fazer para reverter.

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  2. Legal você voltar a postar! Conheço muitos "Juninhos", alguns até com boa renda, mas que não ajudam 1 real no orçamento familiar e moram com a família para economizarem. Alguns com mais de 30 anos e um ou outro até mais de 40.
    Infelizmente há uma horda de Peter Pans à solta no mundo, se recusando a crescer e assumir responsabilidade.
    Recomendo a leitura de Jordan B. Peterson sobre o tema, é um bom tapa na cara dos Juninhos (pena que o conteúdo nem sempre chega em quem precisa).
    Abraço

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    1. É uma felicidade escrever, mas como falei por e-mail, preciso de inspiração e disponibilidade.

      Eu acho normal morar com a família até completar 1 ano de emprego ou até casa. Depois disso, como dizemos aqui, tem que pegar o beco.

      Há cumplicidade dos pais e conveniência misturada com mau caratismo de quem se aproveita deles.

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  3. Olá MenosQueganha

    Esses casos são mais comuns do que imaginamos. Algo que pai me ensinou na prática foi:

    Comecei a trabalhar ou melhor estagiar e antes de receber o primeiro salario/bolsa, ele me disse: 10% do que ganha fica em casa para cobrir as suas despesas. Na época fiquei um pouco chateado e continuei contribuindo até casar (mesmo saindo de casa, continuei ajudando). Atualmente, 25 anos depois eu acredito que foi um dos melhores aprendizados que recebi. A responsabilidade de ajudar e indiretamente controlar o orçamento com o restante do salário.

    Abraços,

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    1. Excelente!

      Meu pai também me deu um grande aprendizado que abordei nesse post: https://menosdoqueganha.blogspot.com/2020/06/dado-e-dado-emprestado-e-emprestado.html

      Dá uma olhada.

      Valeu, Voando abaixo do radar!

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